Cinema Reflexão e Opinião

| Anti-herói ou vilão? | The Penguin

O anti-herói ocupa um lugar peculiar entre o herói e o vilão. Mas onde exatamente? Para entender essa figura tão ambígua, precisamos primeiramente revisar o que define um herói e um vilão.

Se perguntássemos aos gregos 300 anos antes de Cristo, descreveriam o herói como alguém dotado de coragem e força, sem focar em características morais ou éticas. À medida que as culturas mudaram, o conceito de herói também evoluiu. Hoje, temos figuras exemplares como Superman e Capitão América, personagens quase perfeitos em força, beleza invejável e com uma moral inabalável. Mas e o vilão? Tradicionalmente, ele é alguém cruel, movido pela “Tríade Sombria”: psicopatia, narcisismo e maquiavelismo. Hannibal Lecter, por exemplo, ilustra o vilão clássico que pratica o mal pelo prazer de praticá-lo, sem nenhuma “justificativa” (se é que pode haver justificativa em fazer o mal).

Então, onde entra o anti-herói? Ele está entre esses dois extremos, combinando características heroicas e sombrias. Um bom exemplo é Dexter, que canaliza seu lado sombrio e sua violência para eliminar criminosos, distorcendo o conceito de justiça de maneira que, para muitos, ainda parece justificável. Outro caso que exemplifica bem o anti-herói é Robin Hood, afinal roubar fere princípios sociais e mandamentos divinos, mas roubar dos ricos e entregar aos pobres parece justo e justificável. O anti-herói provoca dilemas morais justamente por ser a linha tênue, ou ainda estar contido no bem e no mal.

Mas o que tudo isso tem a ver com The Penguin, série da HBO Max de 2024 dirigida por Craig Zobel? A série dá sequência aos eventos do filme The Batman (2022) e traz Collin Farrell na pele do icônico Pinguim em uma trama de máfia que se desenrola em Gotham City.

Opinião e Reflexão

O personagem Oswald Cobb, conhecido como Oz, começa a série como alguém que veio da periferia e deseja conquistar riqueza e status social, não importando o preço. Em parte, esse desejo é impulsionado pela necessidade de superar os traumas das dificuldades financeiras e de cuidar de sua mãe, Fran Cobb. Oz conta ao fiel escudeiro Victor sobre como, em sua juventude, admirava um mafioso específico que cuidava e protegia as pessoas do seu bairro e, por isso, tinha respeito e honra de todos e demonstra querer imitá-lo. Até aqui, Oz se encaixa como um anti-herói, justificando suas ações sombrias para proteger aqueles que ama.

No entanto, quando sua mãe o despreza e o declara como uma grande decepção, Oz começa a abandonar qualquer fio de moralidade, transformando-se no cruel vilão Pinguim, que faz o mal pelo prazer do mal. As relações afetivas estimadas por ele parecem de nada valer depois de se assumir o vilão que é. Isso nos leva a questionar: Oz tomava ações sombrias realmente por altruísmo ou suas justificativas eram apenas uma desculpa para satisfazer desejos egoístas e ser cruel? A série nos provoca a questionar e duvidar quais de fato eram as motivações do personagem e isso é cativante. Até que se segue o último episódio onde uma série de eventos e circunstâncias culminam no plot twist e no vir a tona o cruel vilão Pinguim, dentre os eventos dois se destacam: manter a mãe viva em estado vegetativo como “castigo” (mesmo que esta lhe havia implorado e o feito jurar que não a mantivesse viva nesse estado) e assassinar Victor logo após a declaração do mesmo sobre o sentimento de acolhimento e paternidade que ele sentia para com o Oz. A crueza desses dois fatos nos tiram quaisquer dúvidas sobre a vilania de Oz desde o início, apesar de a série sempre subverter no personagem esses dois conceitos.

O anti-herói é a linha tênue entre o herói e o vilão. Contém características de ambos e, desafia nosso julgamento como espectadores. Mesmo que seus atos sejam questionáveis, a justificativa por trás deles é, por vezes, tão plausível que nos leva a sentir um desconforto. E talvez seja essa a verdadeira maravilha do anti-herói. Como atos terríveis, porém, trajados de motivações justas e justificáveis podem coexistir? Já o vilão é mau e cruel por ser mal e cruel tão somente, não precisa de explicação, é a essência dele. Esse tipo de personagem também personifica nas telas a crueldade e vilania contida em cada um de nós (espectadores) e, por isso, nos cativa simplesmente pelo fato de serem vilões, cruéis e sombrios.

The Penguin é uma das melhores séries de 2024 e fica aqui a recomendação.

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